sábado, 3 de setembro de 2011

Errata

Me devo uma correção.
Ao dizer que "meu amor,
maior que eu, maior que a dor, me superou" 
Eu menti, uma mentira tola.
Minha cegueira insistente me fez desonesta.
Alterei meu próprio ato incontido, tão falho quanto um tique. 
Ignorei a ressaca de um amor morto.


Tentando trazê-lo de volta à vida,
modifiquei meu texto original.
Manipulei palavras.
Traí fontes. 
Neguei minha própria experiência.


E assim, onde se lê "maior que eu, maior que a dor",
por favor, uma advertência:
eis a errata da minha alma traída, que corrige: 
maior que eu, "menor" que a dor.
Agora sim. 





quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Meus limites

Discorrendo sobre limites necessários
pois que produzidos por dores incalculáveis
maiores que expectativas ingênuas
frutos de minha experiência irrevogável

Indeferem pedidos de defesa
Sem que sejam evocadas legalidades
(de  um Código qualquer, Artigos ou parágrafos únicos)
Meus limites têm raízes consuetudinárias
São legítimos, são meus.

Meus limites impõem fronteiras
que, embora não existam em essência, existem de fato
Me resguardam o direito à propriedade privada de mim
Inviolável não por escritura, mas por individualidade
esta minha propriedade não permite ingressos de outrem


Mas nem sempre foi assim,
Na verdade, meus limites se mostraram  a mim
num inesquecível e nada qualquer dia de ontem

E desde então me garantem meu espaço
indivisível, intransponível e não compartilhado.
Esses meus limites são, por assim dizer e com todos os cuidados,
a garantia de um espaço sagrado.





domingo, 7 de agosto de 2011

O meu fracasso

Não é meu o jargão sei do que sou capaz.
O que na verdade eu posso dizer é que “sei do que não fui capaz”.
Isto sim é inequívoco, preciso.
E isto é o meu próprio fracasso.

Mas o meu fracasso tem um sabor doce, quando tenho vontade de doce, e salgado quando quero o contrário.
Meu fracasso fundamenta minha certeza.
Meu fracasso, em retrospectiva, me apresenta um passado rico em sinais contra os quais lutei bravamente, porém sem sucesso.
Meu fracasso, hoje, dorme e acorda comigo.
relativizado e subvertido
Me dá beijos de “bom dia”
Meu fracasso resignou-se em reconhecer
Que não se supera o amor, quando ele existe.
Pois meu fracasso me mostrou
Que meu amor, maior que eu, maior que a dor,
Em longo estágio de vigília
Me superou.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Senha

Eu disse, não disse?
Aquela data significativa
dia a dia na memória,
mês a mês comemorada,
se esvaziou.
E na dinâmica da cidade,
no pragmatismo eletrônico
Que irônico!
Nada mais que uma senha
Uma senha de cartão de Banco.

sábado, 26 de março de 2011

o hábito que me veste a mudança

Mudei os móveis de lugar
Os quadros migraram de paredes
As cores são outras
E com elas as vistas das janelas
De cá avisto o horizonte
Plano, verde, distante.
Ah, a rua também é outra
Mudei de endereço
Mudei, portanto, o lugar de onde vejo
Aqui só entra quem eu quero

Também há portões que me libertam
De todos eles tenho as chaves
Se eu quiser eu fico
Se eu quiser eu saio
E quanto ao "quando", menina,
sou eu e ninguém mais quem determina

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Sábado

Dia chuvoso
Tarde de silêncio
Noite fria e mais extensa que as outras
Domingo tedioso
Como tediosa às vezes se mostra a vida
Sinto-me apegada ao sábado
ao fim de tarde de sábado da vida
Gostaria que amanhã fosse novamente sábado
Não qualquer sábado
Mas o fim de tarde de sábado da vida.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Meu Antiquário involuntário

expondo, guardando,
colecionando, somando

valorizado
estimado
disputado

com o tempo

envelhecido
esquecido e
sem cuidados,
carcomido
e enferrujado

tanto mais
corroído
e sem valor

poderia eu
querendo-te preservado
restaurar-te?

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Pela frente, pelo verso, com as palavras

Nos seus braços vivi a mais bela e pura surpresa e leveza do amor invasor
Seu cheiro e voz e toque e suspiro e silêncio, a serenidade me trouxeram 
Minha loucura de antes, dissipada pela toada deste encanto, fora desapropriada como quem mais não tem morada. 
E ao seu lado fui sendo. Inédita, entregue, absoluta. Sua.
Me desfiz dos medos e receios como quem se desfaz das roupas velhas que não mais lhe servem e apenas inutilizam um espaço no armário.
Me doei, me fiz, me recriei. Tudo isso ao seu lado, sob e sobre você, pela frente e pelo verso.
Sem remorso, sem dúvida e sem protesto. 

O abismo criado pelo seu não me fora tão invasor quanto o amor de outrora. 
Um e outro sentidos com a mesma intensidade e verdade me trouxe e me levou a sanidade.
Minha loucura então dissipada, novamente me arrebatou o espírito e eu chorei. Chorei de dor, de desencanto, de desespero, de perplexidade, de desamparo. Não acreditei, não pude, não quis. Chorei pelo abandono. Por várias vezes perdi a fome, o sono e o desejo de ser, de ser sem você.

Com o instinto de quem se agarra à vida me refiz. Como um réptil me arrastei e, me esfregando em pedras e chão áspero e hostil, troquei de pele, de cor e de dor. Esta agora doía como a dor da cura, lenta, diária e promissora.  
Não sei bem de quais promessas me apropriei. Sei que o fiz. E se hoje me olho e me gosto é porque em cada trecho do caminho reconheci mais que um itinerário, mais que um destino.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Uma certa dor!

Dor de amor é como queimadura
É de fora que nos toca, mas é por dentro que devora
O quanto dura e o tempo da cura
Se são dias ou se são horas
Se é rápido ou se demora
é bom mesmo que vá embora!

Uma e Outra

Uma quer que Outra espere

Mas Uma não sente falta de Outra

Já Outra só pensa em Uma

Como Uma prescinde da Outra

Uma e Outra são, agora, mais que duas

Nota sobre um caderno encharcado

Não se apaga com água os anseios da alma
Seria incapaz de escrever o mesmo duas vezes
Da mesma forma sou incapaz de me desfazer dos papéis manchados


Todo esse borrão e as palavras nele discerníveis
me apresentam como sou:                                          
etérea, porém insistentemente corpórea
Não sou marca d'água
Sou alto relevo

 
                                          
                                              

Minhas incontáveis Quedas

E a cada disparada de minh'alma uma nova Queda
A cada manifestação sua uma surpresa
Estar só hoje é diferente da solidão anterior
As impressões são todas móveis
Não existe essência,
nem tampouco são as coisas todas aparências
O mundo é o que é em nós
A realidade é como a vemos

Transmutação reversa

Não se trata de metamorfose,
pois nada cristaliza a vivência que a precede
Se a cada dia me olho
é porque em cada um deles revejo e espero
Sou assim como uma espécie de ser pendular,
porém não sujeito a movimentos regulares
Troco de pele, troco de corpo,
substituo meu envoltório nada permanente

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

seu olho é um oceano de contos

o mar quente da Bahia
entre tantos enredos e idioletos
crônicas, estórias e sonetos
entre tantas vidas, idas e vindas
entre todos os cantos desbravados

entre sonhos despidos de unicidade
de verdades e universos cravados
entre tantos desejos e vislumbres,
permeados de certezas desfeitas

entre-lugares e sujeitos errantes
prosas e narrativas selvagens
entre as inconstânicas da alma
e realidades multiversais

entre tudo o que há de possibilidades
entre expectativas e saudades
entre todas as fendas da armadura
entre todos os cômodos


entro sem bater, nado sem salvaguardas,
pois seu olho é um oceano de contos

Ficto

Daquele que perdi
Quero-te
o retorno
a despedida
a cicatriz
a ferida
quero o outrora
quero agora
o depois e o apriori
o que sobrou
o que vigora
teu perdão
tua glória
quero tudo:
o sim, o não, o talvez
e tudo o mais que se desfez

ser poeta

tod@s @s grandes poetas viveram um lado cotidiano da vida
pagaram contas ou equivalentes
sentiram tédio
ou se viram valentes
ou poetas
na embriaguez

Nunca mais

"nunca mais" é algo que se deve dizer?
"nunca mais" não se diz sem razão
todas as vezes que eu disse "nunca mais" eu menti
uma mentira vital
"nunca mais" é sempre um não

Minhas duas estações

Minhas pretensões nunca são modestas
sejam alegrias, sejam moléstias
Desta minha desrazão, contudo
brota um tipo de infortúnio que, confesso,
me faz mais inverno que verão
Ocasionalmente sou outono,
quando de mim se despede
um bocado de folhas secas
de cores desbotadas e intensidades desfeitas
Muito mais raramente sou primavera
Eu na verdade e bem à brasileira
sou feita de duas estações:
ora sou chuva, ora sou seca
Não, na verdade não
Sou metade dilúvio
Metade sertão

Sobre o tempo

com o passar do tempo reclamamos da sua agilidade e insistência em seguir
pelo mesmo caminho desejamos que o tempo passe mais depressa
para superar dores de amores
e outros lutos
para que entre o próximo salário
para que o ano seguinte seja melhor que este ou aquele
para que cheguem as férias
para que aconteça o que se espera e espera e espera
para a colheita vindoura
para fazer aquela viagem planejada
para se aposentar e não fazer nada
para rever alguns entes
para parar de fumar
para arrumar os dentes
e não seria um paradoxo
se não quiséssemos ao mesmo tempo
voltar e quiçá desejar que novamente
o tempo não parasse de passar

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Não mais quero estandartes

E aquele estandarte de amor promissor
pouco a pouco desbotou, perdeu a cor
Desconfortável e impróprio às minhas medidas
dele me despeço e me ponho nua

De um ponto não fixo, mas estável
modifico o que fui
dou adeus a um futuro vivenciado
Um futuro passado

Me defendo dos desenganos
me resguardo de alguns medos
Me fortifico e me liberto de alguns danos

O incerto hoje me agrada,
pois a certeza de antes pouco a pouco me desfigurava
agarrada que estava ao meu futuro prefigurado

Minha nudez hoje compartilhada
me aponta outras possibilidades
não mais quero estandartes

Quero mesmo esta outra parte
a quem ofereço com a mais tenra verdade
essa minha mais nova condição de liberdade

domingo, 16 de janeiro de 2011

sem risco...

...sem ternura, sem medo, sem afeto, sem prisão e sem presença, sem conforto e sem latência
cem mil vezes o amor morreu.

As primeiras linhas

Quando traçamos as primeiras linhas de um caminho a percorrer, tudo parece certo, inequívoco.
Nas terceiras, quartas, quintas linhas, em razão das inexatidões decorrentes das primeiras
resolvemos, quem sabe, nos arriscar
nas oitavas, nonas, décimas, mudam-se os tons e alturas das vozes, dos riscos, das certezas
finda a escala, não repetimos.
E caso aconteça
é pianíssimo.